quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

CARNAVAL, JOGOS OLÍMPICOS DE INVERNO E POLÍTICA

Desejo muito registrar neste texto as ansiedades que tenho sentido neste momento de nosso tempo e de minha vida em particular. Tantas situações, tantas mudanças, tantos acontecimentos, mas também tantos comportamentos antigos em pessoas que achávamos: iam fazer a diferença.

Simultaneamente estamos mergulhados, mudando apenas a intensidade da participação, em três grandiosos eventos: o carnaval, os jogos olímpicos de inverno no Canadá e a Política. Aqui, no nosso lugar, está a maior festa de participação popular de rua, é claro disputando o título com outros locais como Recife e Rio de Janeiro. Mas não vou entrar no mérito, tampouco nas especificidades de cada lugar. Por não estar motivado a “brincar” o carnaval, acabei ficando em casa a maior parte dos dias "de momo". Aliás, a cada dia que passa a política, o que ela é e, o que se faz em torno dela, suas conseqüências para as nossas vidas, me deixam profundamente reflexivo diante das mais diversas manifestações populares, onde se reúnam grandes contingentes entretidos com uma situação proposta: seja cultural, seja política. Não consigo apartar o meu olhar dos momentos na história da humanidade, onde podemos ler, ver e extrair os comportamentos de dominação de grupos sobre outros; de brancos sobre negros, de homens sobre mulheres, daqueles que dentro de suas próprias etnias se destacam: pela força e autoritarismo, ou pela autoridade, conquista dos corações através de um apelo apaixonado por justiça, pelo que é certo, pela liberdade; através de uma conduta forte, determinante e exemplar nestes argumentos. Fico intrigado, pensando os porquês das coisas. Pensando como devo me conduzir diante do que vejo, das conclusões que tenho dos diversos comportamentos que me cercam, na nossa terra; pensando quanto tempo eu já perdi e quanto tempo me resta.

Olho para a história dos povos africanos, lá e aqui; dos ascendentes e de nós descendentes. Fico a pensar o quanto temos reproduzido ou aceitado os modelos de reprodução de um poder branco, enquanto sistema de pensamento. Quando não são brancos os seus gestores, coisa que representa a maioria das vezes, são negros com aquele modelo. Não quero dizer com isto que todo branco é em si mesmo portador desse sistema; mas que parece ficarem mais a vontade para reproduzi-lo, visto que não conseguem ter a subjetividade de quem sofre na pele o chicote histórico que legou a determinados segmentos uma posição de desvantagem. Estamos vivendo um governo na Bahia que elegemos em primeiro turno, que representa uma vitória dos movimentos sociais, inclusive o Movimento Negro; mas que suscita necessidade de profundas análises sobre vitórias ou fracassos no que se pretendia. Sem querer se simplório, devo afirmar tem havido ganhos, mas também nunca foram tantos jovens negros e negras assassinados; e para mim não importa de onde sai o tiro, mas importa o que sai da boca dos que governam. Porque “a boca revela do que está cheio o coração”. Se não estivesse a morrer a juventude negra, mas a branca de classe média, sem dúvida, todos os responsáveis já teriam sido pegos, principalmente aqueles que estão nas estruturas de poder do Estado. Pesadas políticas, com grandes somas do recurso publico estariam sendo aplicadas, para contornar as motivações externas ao controle do Governo. Mas infelizmente, “a carne mais barata do mercado é a carne negra”; espero chegar o dia em que todas as carnes sejam para todos muito caras.

Assistindo a abertura dos jogos olímpicos de inverno, na noite de Sexta-feira de carnaval, das tantas coisas que me passaram pela cabeça, duas quero destacar: uma delas, o Paulo Henrique Amorin, da Record, fez referência: em 2016 serão as olimpíadas de verão aqui no Brasil e, nas palavras dele, as quais em parte passaram à minha cabeça, “que o governo brasileiro possa considerar o multiculturalismo e a formação do povo brasileiro”. Só este pensamento daria uma tese de douramento, visto a profundidade do tema. Até que ponto os mandatários de qualquer partido hoje, da situação ou da oposição, orgulham-se ou constrangem-se pela história do Brasil? Um dos comentaristas da referida cobertura, citou que hoje no Canadá só haviam 750 mil “Aborígenes” (numa comparação histórica são tidos como os índios brasileiros) e “nós temos mais índios que eles”; ainda acrescentou “nós não tratamos os nossos índios, como os canadenses tratam os deles”; mas parou por aí! Falaram da tradição remota daquele país que é o tambor (solitário) e disseram que nós também passamos por aí, sendo que com mais de um tambor; entretanto, não consegui perceber em suas falas referências aos povos africanos “trazidos’ para o Brasil. A festa olímpica canadense, considerou fortemente suas origens e destacou sua formação com quatro povos iniciais, inclusive tendo no grupo de chefes de estado, naquela cerimônia de abertura, a presença dos líderes políticos destas nações. Coisa inédita!

Meu segundo destaque é para realidade de extermínio que vive nossa juventude negra no Brasil, especialmente na Bahia e Rio de Janeiro e provavelmente Maranhão também. Faltam 6 anos para os jogos olímpicos. Quantos jovens perderemos daqui para lá? Quantos jovens poderemos salvar com a política certa, que articule incentivo ao esporte e transferência de renda? E quem está pensando nisto? Geralmente os países anfitriões apresentam as maiores delegações e investem para que o maior número de medalhas conquistadas permaneçam ali. Na verdade, faz muito tempo que reflito sobre o quê poderia retirar as pessoas da trajetória do tráfico e da criminalidade, ou pelo menos ser oferecido como alternativa promissora à juventude, em especial á juventude negra; vítima histórica do descaso público, do esvaziamento de recursos sobre os instrumentos de educação e mesmo esporte e lazer (até no tocante a sua concepção), instrumentos que tiveram no passado numa rota de acesso crescente do referido segmento.

Estou convencido de que é o momento dos movimentos sociais, dos que estão dentro da estrutura dos governos, e aí quero me concentrar na Bahia _ dadas as condições de hegemonia política da “esquerda” _ de pensar profundamente sobre esta via. Recebi um e-mail, sobre o quanto foi investido nos blocos temáticos de africanidade, para o carnaval 2010. Achei louvável, os trios recebem muito mais. Porém é inédito. Contudo, no máximo, os lucros ficam com os donos dos Blocos, muito justo para alguns, que trabalham o ano inteiro em causas sociais pela juventude, sem salário, sem ajuda de custo, somente pelo compromisso visceral. Justo também para outros que apenas fazem o carnaval. Se os brancos ganham dinheiro publico para isso, porque os negros também não podem. Entretanto, não chegam à ponta do grosso da comunidade negra. Haverá um lucro simbólico, para a cultura e para a demarcação de território, mas pouquíssimos, se é que haverá algum, investirão nas comunidades o que ganharam com seus blocos, a ponto de manter um numero significativo de jovens fora da “mira” do cemitério.

Aí, finalmente, fortalece minha reflexão sobre a política, fechando a tríade do meu pensamento neste texto. No Fórum Social Mundial Temático-Bahia, ocorrido entre os dias 29 a 31 de janeiro último; TIVE O PREVILÉGIO DE MEDIAR UMA MESA, construída pela Secretaria da CUT de combate ao racismo, sobre “NEGRAS E NEGROS NO PODER, AVALIAÇÃO E DESAFIOS”, dentre outros nomes importantes na Cidade, estava o do Professor Hélio Santos, que fez uma indagação no mínimo preocupante: “por que os negros no Brasil votam em seus inimigos?” Dentro da própria reflexão o professor destacou que a população negra tem votado em pessoas que os traem depois; mas continuam votando neles! Bem, sabemos os motivos e os jogos de manipulação aos quais estamos todos submetidos, em menor ou maior grau. Sabemos dos jogos de interesses pessoais que orbitam as cabeças da militância, muitas vezes até em função da sobrevivência. Mas principalmente, sabemos o quanto a “população simples” é estimulada e doutrinada todos os dias a pensar que “política é isso mesmo”! Que qualquer um que “entre” (como se fosse possível viver fora dela), “vai fazer as mesmas coisas”! “Vai procurar se dar Bem!” Então o quê o professor levantou não deveria me chocar... Mas, por quê chocou?


As pessoas para quem escrevo este texto, não são aquelas que ainda precisam passar por uma formação para saber o que é política, para compreender que tudo é política e para discordar dos que definem política pelo pragmatismo do “só faço se tiver ganhos para mim, meu grupo, meus projetos”; os que a definem como lugar onde se pode ou se deve fazer carreira profissional e não, antes de tudo, estar a serviço de uma vontade coletiva.

Sempre tive nojo dos deliberadamente descompromissados, dos manipuladores, dos “capitães do mato”, dos traidores, dos que se vendem e vendem seu povo, não importa o sexo ou a preferência afetiva. Tenho sido tomado por uma prática incontrolável de romper com quem passo a classificar neste contexto, seja pessoa ou grupo.

2010, ano eleitoral, onde todos nós, de todos os segmentos, organizados ou não, subimos alguns degraus na escala de cidadania e voltamos a ser visibilizados. Mas subimos o suficiente para manter as lideranças de nossos destinos em outras mãos, sem ameaçá-las; às vezes até “mãos companheiras”, que vão definir por nós, pós pleito, os melhores caminhos, as melhores estratégias que devemos obedecer... Mãos que vão até nos afagar, contanto que nos mantenhamos em suas trincheiras. Esperando as migalhas. O meu entristecimento neste carnaval deve ser este, por ver ou perceber algumas coisas que uma parte não está vendo e me sentir só, como outros que já viram.


Valdo Lumumba
Carnaval de 2010
(escrito durante a madrugada de sexta para sábado)

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Grato pelo seu acesso ao meu bloog!

Mas, deixe sua opinião sobre este assunto!